Em meio a propostas que ameaçam banir produtos consumíveis à base de cânhamo, setor do álcool nos EUA defende a manutenção da legalização dos canabinoides naturais e alerta para impactos econômicos e regulatórios
A Wine & Spirits Wholesalers of America (WSWA) — uma das principais associações da indústria de bebidas alcoólicas dos Estados Unidos — declarou oposição à nova proposta de lei orçamentária aprovada por um subcomitê da Câmara dos Representantes, que pretende proibir a maioria dos produtos consumíveis derivados do cânhamo, incluindo itens com traços de canabinoides como o delta-8 THC. A entidade, que já defendeu publicamente a legalização da cannabis em nível federal, pede que o Congresso reavalie os termos do texto e preserve a legalidade dos derivados naturais da planta.
Segundo a WSWA, o objetivo de coibir o mercado de canabinoides sintéticos é legítimo, mas a proposta atual vai além do necessário e ameaça um setor que hoje é regulado por estados norte-americanos e que opera em conformidade com a Lei Agrícola de 2018 (Farm Bill), que legalizou o cânhamo industrial.
“A WSWA apoia a eliminação de canabinoides sintéticos e não naturais, que representam um risco à saúde pública. Mas proibir todos os canabinoides não é a solução. Isso pode acabar atingindo produtos legais e regulamentados que sustentam um mercado dinâmico e promissor”, afirmou Francis Creighton, presidente da associação.
A crítica central da WSWA é que, ao adotar uma proibição generalizada, o governo federal abre espaço para o avanço de atores ilegais e impede que estados continuem suas políticas de regulação responsável.
“Se essa proposta for adiante, estaremos entregando o mercado a operadores clandestinos, minando estruturas regulatórias estaduais que funcionam e colocando em risco a segurança do consumidor”, alertou Creighton.
A associação propôs que o Congresso remova do projeto de lei o trecho que redefine o cânhamo como qualquer produto que contenha “quantidades quantificáveis” de THC ou de compostos com efeitos semelhantes — o que poderia banir inclusive produtos à base de CBD com traços de THC, hoje amplamente comercializados de forma legal.
Empresários do setor de cânhamo também se manifestaram. Shawn Lederman, da distribuidora Greenlight (Flórida), afirmou que a medida seria devastadora para empresas que atuam em conformidade com a lei.
“Investimos em empregos, infraestrutura e conformidade para trazer responsabilidade a esse setor. Uma proibição total eliminaria nossos esforços e entregaria o mercado a operadores ilegais”, disse Lederman.
John Giarrante, da Show Me Beverages (Missouri), reforçou que produtos como o delta-9 derivado do cânhamo têm sido comercializados com responsabilidade e regulação adequada:
“Construímos um negócio transparente e legal para atender à demanda do consumidor com foco na saúde pública. Essa proposta colocaria tudo a perder, impactando a economia e empregos locais.”
Disputa política e cenário regulatório
Apesar das críticas, parlamentares republicanos envolvidos na formulação do projeto — mesmo os que apoiam a legalização da maconha — demonstraram pouca preocupação com os impactos no setor de cânhamo, que pode ser severamente afetado caso a nova definição federal entre em vigor.
O projeto altera a definição de cânhamo e proíbe qualquer produto com traços de THC ou compostos similares, mesmo os não psicoativos. Isso inviabilizaria boa parte do mercado atual de CBD, cujos produtos podem conter até 0,3% de THC em peso seco, conforme previsto na legislação atual.
O trecho polêmico já havia aparecido em uma proposta anterior do deputado Mary Miller (R-IL), que tentou incluir a emenda no texto da Farm Bill de 2024, sem sucesso.
WSWA propõe modelo baseado na regulação de álcool
Como alternativa à proibição, a WSWA sugeriu três pilares de regulação federal inspirados no setor de bebidas alcoólicas:
- Proibição de THC sintético e canabinoides produzidos artificialmente;
- Sistema federal de testes e rotulagem para produtos de cânhamo;
- Autonomia dos estados para regular o comércio e a venda no varejo.
Em artigo recente publicado no portal Marijuana Moment, Creighton reforçou que a regulação é preferível à proibição, destacando que o modelo atual dos estados pode servir como referência para um marco federal mais equilibrado.