Mais de um ano após a entrada em vigor da legalização parcial da cannabis na Alemanha, o debate sobre seus impactos continua acalorado. A União Democrata Cristã (CDU), maior partido da oposição, intensificou sua campanha para revogar a medida, classificando a política como um “erro capital” e alegando falhas nos objetivos de saúde pública e segurança jurídica.
Desde 1º de abril de 2024, adultos alemães com 18 anos ou mais passaram a poder portar até 25g de cannabis em público, manter até 50g em casa e cultivar até três plantas para uso pessoal. A partir de julho do mesmo ano, também foram regulamentados clubes de cultivo coletivo, limitados a 500 membros e com operação estritamente não comercial.
Apesar das regras rígidas e restrições quanto ao consumo em locais públicos, áreas escolares e infantis, a medida enfrenta forte resistência política, principalmente da CDU, que argumenta que a política não entregou os resultados prometidos.
CDU pressiona por revogação imediata da lei da cannabis
A deputada Christin Christ, representante da CDU na área da saúde em Hamburgo, tem sido uma das vozes mais críticas. Em entrevista ao jornal Welt, ela afirmou que a legalização representa uma ameaça à saúde pública e à juventude alemã. “Hamburgo está sendo inundada por drogas, agora até parcialmente legalizadas. Isso é o oposto de uma política de saúde responsável”, declarou.
Christ argumenta que os custos para implementação e fiscalização da nova legislação estão sobrecarregando os cofres públicos e que as economias prometidas pelo governo federal, que superariam 1 bilhão de euros por ano, não se concretizaram.
Segundo projeções iniciais do Ministério da Saúde, a legalização deveria reduzir em:
- €800 milhões os gastos com policiamento;
- €220 milhões com o sistema judicial;
- €35 milhões com agências de repressão.
Contudo, o Senado de Hamburgo contesta essas projeções, afirmando que ainda é cedo para verificar benefícios fiscais concretos e que o mercado ilegal continua operando de forma significativa.
Mercado ilícito segue ativo, e resultados em saúde pública são questionados
Relatórios internos de Hamburgo indicam que não houve redução expressiva na criminalidade associada à cannabis, tampouco avanços nos indicadores de saúde pública. Autoridades locais afirmam que o mercado negro permanece robusto e que os clubes de cultivo não substituíram a demanda reprimida do comércio ilegal.
“Legalizar a cannabis acabou exigindo mais vigilância, mais regulamentação, e isso está consumindo recursos”, criticou Christ, que também aponta riscos de aumento no consumo entre jovens e agravamento de quadros de saúde mental.
Coligação do semáforo sob pressão
A legalização foi aprovada sob o governo federal da chamada “coligação do semáforo”, formada por SPD (Partido Social-Democrata), Verdes e FDP (Partido Liberal). Internamente, o tema gerou divergências mesmo entre membros da base aliada, como o prefeito de Hamburgo, Peter Tschentscher, e o senador do Interior, Andy Grote, ambos do SPD, que inicialmente se opuseram à medida.
Agora, a CDU está pressionando o Senado de Hamburgo a apresentar uma proposta de revogação ao Bundesrat (Conselho Federal), alegando que não se pode esperar até o outono, quando está prevista uma avaliação oficial da política de legalização. “Espero que o Senado defina uma posição clara e promova, a nível federal, uma rápida reversão da legalização”, afirmou Christ.
Futuro incerto: entre avanços e retrocessos
Embora os defensores da legalização afirmem que a medida é fundamental para reduzir danos, aliviar o sistema penal e controlar a qualidade da cannabis, os opositores conservadores veem o modelo atual como ineficiente, perigoso e ineficaz contra o tráfico.
A Alemanha se encontra agora diante de uma encruzilhada política. Se a pressão da CDU surtir efeito, o país pode caminhar para um retrocesso legislativo. Por outro lado, a continuidade da legalização exigirá ajustes finos nas políticas públicas, ampliação de campanhas educativas e combate mais eficaz ao mercado ilícito.