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Alto comissário da ONU defende descriminalização das drogas: “A proibição está falhando”

by Redação

Volker Türk, Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, defendeu mudanças urgentes nas políticas de drogas, afirmando que a criminalização e a proibição estão prejudicando as populações mais vulneráveis ao redor do mundo.

Durante a Conferência Internacional de Redução de Danos, realizada na última semana em Bogotá, na Colômbia, Volker Türk foi enfático: “A descriminalização das drogas é um passo crucial para uma política mais humana e eficaz.” Segundo ele, o modelo proibicionista falhou em reduzir o consumo de substâncias e só agravou desigualdades sociais e violações de direitos.

“Precisamos de uma abordagem transformadora”, afirmou. “Em vez de medidas punitivas, precisamos de políticas de drogas com recorte de gênero e baseadas em evidências, fundamentadas na saúde pública. Em vez de bode expiatório, devemos garantir acesso inclusivo a cuidados médicos voluntários, moradia adequada e outros serviços sociais. As medidas de redução de danos, que previnem mortes por overdose, são essenciais.”

O comissário destacou a importância de incluir as pessoas mais afetadas pelas políticas de drogas no debate. “A participação de pessoas que usam drogas é especialmente bem-vinda, pois elas foram historicamente marginalizadas, criminalizadas, discriminadas e deixadas para trás — muitas vezes privadas de sua dignidade e de seus direitos.”

Türk afirmou que o proibicionismo alimenta a discriminação estrutural, com impacto desproporcional sobre povos indígenas e pessoas negras. Além disso, chamou atenção para as consequências ambientais da guerra às drogas, como desmatamento, contaminação da água e descarte tóxico de resíduos.

“A criminalização e a proibição falharam em reduzir o uso de drogas e falharam em impedir crimes relacionados às drogas.”

Segundo ele, é necessário substituir o modelo atual por uma regulação responsável, que retire o poder econômico do tráfico e reduza a violência. “Embora não exista um modelo único de regulação responsável, a colaboração é crucial”, pontuou.

Türk ainda ressaltou o papel fundamental da sociedade civil na construção de novas políticas de drogas:

“A sociedade civil tem papel crucial na defesa e implementação de políticas de redução de danos. Os governos devem garantir um espaço cívico aberto, onde pessoas que usam drogas e outras vozes possam se expressar sem medo, assédio ou intimidação.”

Bilhões investidos na guerra às drogas resultaram em violações de direitos e impactos ambientais

Relatórios recentes apontam que a repressão às drogas tem custado caro à comunidade internacional. Segundo a organização Harm Reduction International (HRI), desde 2015, cerca de 13 bilhões de dólares de recursos públicos dos EUA foram destinados a ações globais antidrogas — recursos que poderiam ter sido investidos no combate à pobreza e em direitos sociais.

Outro levantamento da HRI mostrou que, entre 2012 e 2021, 30 países doaram quase 1 bilhão de dólares para projetos de controle de drogas, incluindo 70 milhões destinados a países onde o tráfico é punido com a pena de morte.

Já a coalizão internacional International Coalition on Drug Policy Reform and Environmental Justice apontou que o proibicionismo também agrava a crise climática, destruindo ecossistemas críticos como as florestas tropicais. O relatório alerta que qualquer esforço ambiental sério fracassará se não houver enfrentamento ao “elefante na sala”: a guerra global contra as drogas.

As declarações de Türk seguem a linha de posicionamentos recentes das Nações Unidas. Em 2024, relatores especiais e especialistas da ONU divulgaram um comunicado afirmando que a guerra às drogas gerou “graves violações dos direitos humanos” e pediram uma guinada para políticas de apoio, não punição.

“Instamos coletivamente os Estados-membros e todas as entidades da ONU a colocarem as evidências e as comunidades no centro das políticas de drogas, migrando da punição para o apoio”, diz o texto, que defende investimento em toda a gama de intervenções de saúde baseadas em evidências — da prevenção à redução de danos, passando pelo tratamento e pelo cuidado continuado.

Entre as estratégias recomendadas estão: descriminalização, centros de consumo supervisionado, testagem de substâncias, acesso amplo a naloxona (medicamento que reverte overdoses) e criação de modelos regulatórios alternativos para substâncias atualmente proibidas.

Um relatório da ONU de 2019, assinado por 31 agências — incluindo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) — já defendia políticas de drogas centradas em saúde, ciência e direitos humanos. Desde então, cresce o consenso internacional de que o proibicionismo fracassou — e que políticas baseadas em evidências são o caminho para sociedades mais justas, saudáveis e inclusivas.

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