Decisões reforçam direito à liberdade de expressão e expõem censura de conteúdos sobre o uso medicinal da planta
Duas decisões recentes do Tribunal de Justiça de São Paulo determinaram que a Meta, empresa responsável pelo Facebook e Instagram, reative perfis suspensos que publicavam conteúdos relacionados à cannabis. As decisões reconhecem o direito à liberdade de expressão e criticam a falta de transparência na exclusão de páginas que abordam o tema sob uma perspectiva informativa, científica e comercial.
As ações judiciais foram movidas por uma marca que vende produtos aromáticos inspirados na cannabis e por uma tabacaria que atua na militância pela legalização do uso medicinal da planta. Ambas as contas foram retiradas do ar pelo Instagram sob alegações genéricas de violação das regras da plataforma.
No primeiro caso, a empresa de aromatizantes solicitou o reestabelecimento do perfil, indenização por danos morais, devolução de R$ 1.200 investidos em tráfego pago e compensação por lucros cessantes durante o período em que ficou fora do ar. A conta, que acumulava mais de 23 mil seguidores, foi suspensa em julho de 2024.
A juíza Simone de Figueiredo, da 8ª Vara Cível de São Paulo, acolheu parcialmente os pedidos, determinando a reativação da página e condenando a Meta a pagar R$ 10 mil por danos morais, além de restituir o valor investido em publicidade.
“O bloqueio da conta da autora, sem justificativa plausível, configurou evidente violação contratual. A retenção dos valores investidos em publicidade gerou prejuízo financeiro direto”, afirmou a magistrada na decisão.
No segundo processo, os administradores de uma tabacaria que promove eventos e debates sobre a regulamentação da cannabis medicinal também foram à Justiça após terem seu perfil suspenso. Na ação, pediram a volta da conta, devolução de R$ 248 investidos em impulsionamento e compensações por dano moral e lucros cessantes.
A Meta alegou que o perfil já havia sido reativado e que a suspensão se deu por suposta violação dos termos de uso. No entanto, o juiz Guilherme Rocha Oliva, da 38ª Vara Cível do Foro Central, não se convenceu. Ele determinou a devolução dos valores gastos com publicidade e o restabelecimento da conta, afirmando que a empresa não comprovou nenhuma infração concreta.
“A contestação é genérica, típica de demandas de massa, e não traz elementos sobre o caso específico”, escreveu o juiz.
Ele também destacou que se o Supremo Tribunal Federal (STF) já reconheceu a liberdade de expressão até para conteúdos sobre uso recreativo da cannabis, não faria sentido censurar perfis que discutem seu uso medicinal.
As duas ações foram conduzidas pelo advogado Clayton Medeiros, especializado em direito digital e liberdade de expressão. Para ele, as decisões representam um avanço importante contra a censura algorítmica e a criminalização velada de conteúdos sobre cannabis no Brasil.
“Essas vitórias reafirmam que informar não é crime. O debate sobre cannabis medicinal é legítimo, urgente e protegido pela Constituição”, afirmou.
O bloqueio de perfis que divulgam conteúdos educativos sobre cannabis medicinal não é novidade e tem gerado protestos de pacientes, médicos e ativistas. A ausência de critérios claros por parte das plataformas digitais abre precedentes perigosos para a censura e prejudica o acesso à informação em um tema de saúde pública.
As decisões da Justiça paulista representam um alerta importante: as redes sociais não estão acima da Constituição e devem respeitar o direito à livre manifestação, especialmente quando o conteúdo tem caráter informativo e educativo.
