Pesquisadores sul-coreanos anunciaram a descoberta de um novo canabinoide na maconha, batizado de cannabielsoxa, além de outras substâncias nunca antes identificadas nas flores da planta Cannabis sativa. O estudo, publicado na revista científica Pharmaceuticals, também avaliou o potencial de diversos compostos para combater células de neuroblastoma — um tipo agressivo de câncer infantil.
A equipe, formada por cientistas de universidades e instituições públicas da Coreia do Sul, identificou 11 compostos com possível ação antitumoral, sendo que sete demonstraram forte capacidade de inibir o crescimento de células cancerígenas em laboratório. O neuroblastoma é o câncer sólido mais comum em crianças e a principal neoplasia maligna diagnosticada no primeiro ano de vida. Para os autores, os achados representam um primeiro passo rumo ao desenvolvimento de medicamentos à base de cannabis voltados especificamente ao tratamento dessa doença.
Utilizando técnicas avançadas de cromatografia, os cientistas isolaram os compostos e analisaram suas estruturas moleculares. Além do novo canabinoide, foram descobertas quatro substâncias do tipo clorina — compostos orgânicos geralmente associados à fotossensibilidade e uso terapêutico em tratamentos como fototerapia. Entre os compostos com potencial terapêutico observados, destacam-se o canabidiol (CBD), o ácido canabidiólico (CBDA), o éster metílico de CBDA (CBDA-ME), o delta-8 THC e o canabicromeno (CBG). Dois compostos do tipo clorina identificados pela primeira vez na cannabis foram o 132-hidroxifeoformida B etil éster e a ligulariafitina A.
Segundo o estudo, os canabinoides testados demonstraram efeitos mais potentes contra as células tumorais do que os compostos do tipo clorina. O cannabielsoxa, embora não tenha apresentado toxicidade contra essas células em específico, representa uma nova fronteira no entendimento do potencial terapêutico da planta. A pesquisa contou com o apoio de instituições como a Universidade Wonkwang, a Universidade Kyung Hee, a Universidade Kookmin e o Instituto Nacional de Ciências Hortícolas e Fitoterápicas da Coreia do Sul.
Em paralelo à descoberta, outro estudo impactante foi publicado nos Estados Unidos. Uma equipe liderada pelo pesquisador Ryan Castle, do Whole Health Oncology Institute, realizou a maior meta-análise já feita sobre cannabis medicinal e câncer, analisando dados de mais de 10 mil estudos revisados por pares. A conclusão foi categórica: há um consenso científico crescente e sólido sobre os benefícios terapêuticos da cannabis, especialmente no controle de sintomas relacionados ao câncer, como dor, insônia, estresse, ansiedade e efeitos colaterais da quimioterapia.
Segundo os autores, para cada estudo que demonstrava ineficácia da cannabis, havia três apontando eficácia — um índice considerado extraordinário para a ciência biomédica. Eles ainda afirmam que o nível de consenso identificado rivaliza ou até supera o de muitos medicamentos aprovados pela FDA (agência reguladora dos EUA).
Embora muitos pacientes com câncer já utilizem cannabis para aliviar sintomas — como mostrou um levantamento do Instituto Nacional do Câncer dos EUA (NCI), que estima que entre 20% e 40% dos pacientes recorrem à planta —, o custo ainda representa uma barreira significativa, assim como a ausência de diretrizes clínicas e obstáculos regulatórios. Um estudo publicado na revista Discover Oncology apontou que canabinoides como o THC, CBD e CBG apresentam mecanismos com potencial anticâncer, inclusive ao reduzir a proliferação de tumores. Outra pesquisa mostrou que o uso de cannabis por pacientes oncológicos pode melhorar a cognição e reduzir dores, mesmo após poucas semanas de uso.
No entanto, o uso terapêutico da cannabis ainda enfrenta resistência política. Uma diretriz interna do Instituto Nacional do Câncer dos EUA, vazada à imprensa, revelou que temas como cannabis, vacinas e identidade de gênero passaram a exigir aprovação superior antes de qualquer publicação, refletindo a censura ideológica do atual governo.
Por aqui, o acesso à cannabis medicinal avança lentamente, com foco no uso individual via autorização judicial ou importação. Pesquisas como a sul-coreana e a meta-análise norte-americana reforçam a urgência de investimentos em ciência canábica nacional, bem como da construção de políticas públicas baseadas em evidências — e não no medo ou preconceito. A descoberta de novos canabinoides, como o cannabielsoxa, amplia as possibilidades de uso terapêutico da planta, oferecendo esperança a pacientes oncológicos e desafiando o paradigma proibicionista ainda dominante.