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Câmara de Curitiba analisa projeto que viola direitos fundamentais ao tentar proibir a Marcha da Maconha

by Redação

Por Carol Fayad*

A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) está analisando um novo projeto de lei que visa proibir a realização da Marcha da Maconha na cidade. Protocolada no dia 9 de janeiro pelo vereador Bruno Secco (PMB), a proposta também prevê a aplicação de multas a organizadores e participantes de eventos que, segundo o autor, “promovam o consumo de drogas ilícitas”.

Na justificativa do projeto, o vereador destaca que a maconha pode ser uma “porta de entrada para drogas mais pesadas” e critica a forma como o evento influencia a percepção dos jovens. Ele levanta ainda questões relacionadas à segurança pública, afirmando que a marcha é frequentemente associada a tensões sociais e incidentes de violência.

Crédito das fotos: Religare Ars

O projeto classifica como drogas aquelas substâncias que podem causar dependência, conforme estipulado em legislações vigentes, e autoriza as autoridades a interromperem qualquer evento que desrespeite o projeto de leii. As sanções propostas incluem multas que variam de R$ 10 mil a R$ 50 mil, dependendo do número de participantes, além de penalidades de R$ 2 mil para aqueles que participarem da manifestação.

No ano passado, a manifestação ocorreu com o tema “Não é só pela Maconha”, para chamar atenção também para questões mais profundas: as desigualdades sociais e a violência sistêmica agravadas pela política de drogas no Brasil, com ênfase para o genocídio da juventude negra, que de acordo com dados da Unicef e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, têm 4,4 vezes mais chances de serem mortos do que adolescentes brancos, evidenciando a necessidade urgente de uma mudança estrutural.

Crédito das fotos: Religare Ars

Inconstitucionalidade

Embora o projeto de lei (PL) tenha sido protocolado na Câmara Municipal, a advogada e pesquisadora Mariana German – participante da Rede Jurídica pela Reforma das Políticas de Drogas – aponta que ele é flagrantemente inconstitucional. Segundo German, o projeto ignora uma decisão unânime do Supremo Tribunal Federal (STF), que em 2011 julgou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 187 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4274. Essas decisões garantiram que manifestações públicas que promovam debates sobre mudanças na legislação, como a Marcha da Maconha, são plenamente constitucionais.

Direitos Fundamentais e Repercussão Geral

Em 2011 STF consolidou que a liberdade de expressão e o direito de reunião são pilares da Constituição de 1988. A decisão tem efeito vinculante e repercussão geral, ou seja, aplica-se a todo o território nacional, impedindo que legislações locais ou decisões judiciais contrárias prosperem. Conforme destacado na ADPF 187, a Marcha da Maconha não configura apologia ao uso de drogas, mas é “expressão concreta do exercício legítimo da liberdade de reunião”, traduzindo o juridiquês, um exemplo prático do uso legítimo do direito de se reunir e se manifestar publicamente.

Esta decisão impede que juízes utilizem o Código Penal, em seu artigo sobre apologia, para impedirem manifestações que busquem o debate sobre mudanças nas leis de drogas. “A Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 187), votada no dia 15 de junho de 2011, foi apenas o primeiro dos dois processos iniciados pela Vice-Procuradora Geral da República Deborah Duprat, em resposta às seguidas proibições da Marcha da Maconha em todo o território nacional. Proibir a Marcha da Maconha em Curitiba seria retroceder em um debate democrático já legitimado pelo STF”, afirmou Mauro Leno, antropólogo e ativista. 

Crédito das fotos: Religare Ars

Contribuições da Marcha: Cultura, Saúde e Debate Público

A Marcha da Maconha desempenhou um papel crucial na ampliação do debate sobre o uso medicinal da Cannabis no Brasil, tema que vem ganhando cada vez mais legitimidade. Em 2024, o evento atraiu mais de 10 mil pessoas às ruas de Curitiba, promovendo discussões sobre a descriminalização da maconha, o combate às mudanças climáticas e direitos fundamentais.

“O avanço do uso medicinal da Cannabis no Brasil deve muito às marchas. A sociedade precisa reconhecer que criminalizar o debate sobre a maconha é perpetuar desinformação”, ressaltou German.

Com 18 anos de história em Curitiba, a Marcha da Maconha envolve uma ampla diversidade de coletivos, associações e grupos, de ativistas, mães e familiares de pacientes que fazem uso de maconha para fins terapêuticos. Esse amplo espectro de participação reforça a ideia de que a luta pela legalização é uma luta por dignidade, saúde e justiça social. 

*Carol Fayad é jornalista especializada em comunicação e assessoria de imprensa para empresas do setor da Cannabis e projetos ativistas. Com uma abordagem estratégica e criativa, atua na produção de eventos, o mais recente sendo o Hempreende, além de colaborar com iniciativas que promovem a redução de danos e o antiproibicionismo. Apaixonada por causas sociais, combina a comunicação com ativismo para transformar narrativas e conectar pessoas a ideias inovadoras

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