Juíza destaca impactos da decisão do Supremo em palestra promovida pela Escola Judicial dos Servidores
Na última sexta-feira (23), a Escola Judicial dos Servidores (EJUS) promoveu a palestra on-line “A descriminalização do porte da maconha para uso pessoal: repercussão nos casos concretos”, ministrada pela juíza Fernanda Yumi Furukawa Hata. O evento discutiu os efeitos práticos da decisão histórica do Supremo Tribunal Federal (STF) que pode mudar o tratamento jurídico dado à cannabis no Brasil.
Durante a apresentação, a magistrada fez um panorama sobre a legislação brasileira relacionada ao uso pessoal de drogas. Ela relembrou que o Decreto-Lei 385/1968 foi o primeiro a criminalizar o porte de entorpecentes, incluindo a maconha. Anos depois, a Lei 6.368/1976 passou a diferenciar usuário e traficante, mas manteve a pena criminal para quem fosse flagrado com pequenas quantidades.
O marco mais recente ocorreu com a Lei de Drogas nº 11.343/2006, que substituiu a pena de prisão por medidas alternativas, como advertência e participação em programas educativos, reconhecendo o uso de drogas como uma questão de saúde pública.
Segundo Fernanda Hata, o ponto central da discussão atual é o Recurso Extraordinário nº 635.659, que teve repercussão geral reconhecida pelo STF (Tema 506). Na prática, o Supremo entendeu que o porte de maconha para consumo pessoal não configura crime, embora ainda seja considerado um ato ilícito, sujeito a sanções administrativas.
A decisão fixa um parâmetro: até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas será presumido uso pessoal, o que afasta a aplicação de penas mais severas. No entanto, a juíza alertou para a ausência de critérios objetivos para essa distinção, o que pode abrir brechas para interpretações subjetivas.
Justiça seletiva e racismo estrutural
Hata destacou um estudo da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ), que revela que fatores como idade, escolaridade e local de abordagem influenciam diretamente na forma como a polícia e o Judiciário classificam o indivíduo como usuário ou traficante. Para a magistrada, isso evidencia um preconceito estrutural que precisa ser combatido nas políticas de drogas.
“A discussão vai muito além do simples porte de maconha. Estamos falando de direitos fundamentais, desigualdades sociais, sistema de justiça criminal e saúde pública. É um debate que exige responsabilidade e sensibilidade por parte do Judiciário e da sociedade como um todo”, afirmou.
Apesar do avanço na descriminalização do uso pessoal de maconha, Fernanda Hata reforça que a substância continua sendo considerada ilícita no Brasil. Ou seja, quem for flagrado com cannabis dentro dos parâmetros definidos pelo STF ainda poderá sofrer sanções extrapenais, como advertência sobre os riscos do uso ou a obrigação de participar de atividades educativas.
