A Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (Abrace) venceu um importante processo no Supremo Tribunal Federal (STF) e garantiu o direito de plantar, colher, manusear, produzir e entregar produtos à base de cannabis para seus associados. A decisão, que transitou em julgado na última sexta-feira (18), é um marco na luta pela regulamentação da cannabis no Brasil.
“Não há mais como a Anvisa reverter. Agora o processo volta para João Pessoa e iremos questionar a Anvisa de forma extrajudicial para que ela indique, formalmente, quais as RDC’s precisamos seguir. Depois disso, questionar juridicamente e forçar a Anvisa a fazer uma RDC própria para as associações. Aí a Abrace estará capitaneando a construção desta RDC. É uma nova luta”, ressaltou o fundador e diretor executivo da Abrace Cassiano Gomes.
O processo foi iniciado em 2017, quando a Abrace pediu à Justiça o direito de garantir saúde e qualidade de vida a seus associados. A vitória ocorreu através de liminar e foi contestada algumas vezes pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), assim como pelo Governo Federal, mas o entendimento sempre foi de que este direito estava de acordo com o que rege a Constituição Federal.
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Cassiano frisa que a decisão é uma grande vitória para a Abrace e um passo importante pela garantia do direito de acesso ao tratamento com a planta. “A sensação que eu tenho agora é de que eu posso dormir tranquilo, que a gente vai acordar amanhã sabendo que ninguém, nenhum juiz, nenhum desembargador vai caçar a nossa liminar, nossa sentença e fazer com que a gente mais uma vez tenha que recorrer às pessoas e clamar pelo Direito. A sensação que eu tenho agora é de tranquilidade, mas não quer dizer que a gente não vai lutar por novos processos. Acredito que termina uma batalha, mas começam outras.”
Entenda melhor
Em 27 de abril de 2017 o plantio, cultivo, manuseio e produção de medicamentos à base de Cannabis da Abrace foram autorizados liminarmente pela juíza federal da 2ª Vara, Wanessa Figueiredo dos Santos Lima.
Quatro anos depois, em 2021, após um pedido da Anvisa, o desembargador federal Cid Marconi, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) determinou a suspensão da liminar que permitia o cultivo alegando descumprimento da RDC 327.
Com a decisão, a Abrace foi impedida de plantar, vender o óleo e teve seus trabalhos paralisados, o que afetou o tratamento de milhares de pessoas. Após dois dias de muita pressão de pacientes e seus familiares nas redes sociais, o desembargador decide visitar a instituição e entender o modo de cultivo da matéria-prima e o funcionamento tanto na unidade administrativa quanto na área de cultivo e manipulação.
Acompanharam também a visita representantes da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), autora do recurso; da Procuradoria Federal na Paraíba; da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Paraíba; da Justiça Federal na Paraíba (JFPB); da Polícia Federal; do Ministério Público Federal; e da Defensoria Pública da União. Em paralelo, o TRF5 também promoveu uma videoconferência, da qual participaram senadores da República e deputados federais.
“O desembargador Cid Marconi não conhecia a Abrace. Depois de compreender o nosso trabalho e ver que estávamos há cinco dias paralisados, ele entendeu a importância da associação e revogou a decisão de suspensão das atividades. Com isso, pudemos retomar o trabalho e providenciar as regularizações”, conta.
Para poder se enquadrar na RDC e construir o laboratório para fabricação de medicamentos exigido pela Anvisa em um curto espaço de tempo, a Abrace criou uma campanha nas redes sociais #abracenaopodeparar com o objetivo de arrecadar R$300 mil reais. A iniciativa foi um sucesso e contou com o apoio de pacientes, familiares e diversos famosos como Rita Lee, Caetano Veloso, Cláudio Rodrigues e Xuxa.
“ Para podermos seguir a RDC 327, a gente está tendo que construir um laboratório padrão, um laboratório com tudo que tem de mais moderno. Só para tirar o alvará de obra, demorou um ano e três meses. É tudo muito difícil e demorado. Muito se fala que a gente deveria seguir a RDC das farmácias vivas, a RDC 18. Ficaria muito mais fácil de cumprir, muito mais barato e a qualidade do medicamento poderia ser igual. Acredito que a RDC 18 seria mais fácil para as associações conseguirem se enquadrar”, ressalta Cassiano.
Em 30 de maio de 2022 o ministro Herman Benjamin do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve o direito de cultivo da cannabis por parte Abrace declarando inconstitucional a proibição. A decisão derruba um recurso especial que dizia que o Judiciário não tem prerrogativas para autorizar o cultivo de cannabis no país.
De acordo com o processo, isso “fere os princípios da separação dos poderes”, que está no artigo 2 da Constituição Federal. No entanto, o ministro do STJ manteve o que já havia sido decidido no Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5).
Entre os pontos elencados pelo ministro estão o alto custo com a importação do produto ou dos insumos para a fabricação dos produtos e a necessidade de pessoas, muitas delas crianças, de ter tratamento digno para seus casos médicos.
Abrace é pioneira no país
A Abrace é uma associação de João Pessoa e Campina Grande, na Paraíba, que tem como intuito dar apoio às famílias que precisam de um tratamento com a cannabis. A instituição produz e distribui os produtos para associados. A associação foi criada em 2014 e, desde 2017, é autorizada pela justiça brasileira a cultivar e fornecer derivados da cannabis aos seus associados.
A Abrace foi a primeira associação de pacientes do Brasil a conseguir autorização para cultivar Cannabis para tratamento medicinal. Possui mais de 47 mil associados em todo o Brasil e os produtos fornecidos pela associação auxiliam no tratamento de diversas doenças sendo as principais: epilepsia, Alzheimer, câncer, transtorno de ansiedade, depressão e dores crônicas.
Para saber mais informações acesse a página da Abrace no Instagram ou através do site da associação https://abraceesperanca.org.br/.
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