Estudo mostra aumento expressivo no consumo de cogumelos psicodélicos e alerta para a defasagem entre o entusiasmo público e o conhecimento científico
O uso de psilocibina nos Estados Unidos aumentou significativamente nos últimos anos, impulsionado pelo avanço das políticas de descriminalização e pelos resultados promissores de estudos clínicos sobre seu potencial terapêutico. A constatação vem de uma revisão científica publicada pela Associação Médica Americana (AMA), que também destaca as barreiras impostas pelas leis federais para o avanço da pesquisa sobre substâncias psicodélicas.
De acordo com o estudo, publicado na revista JAMA Psychiatry, o cenário atual se assemelha ao que ocorreu com a cannabis durante as primeiras ondas de legalização nos estados norte-americanos. O entusiasmo social e o acesso público estão crescendo mais rápido que a produção de dados científicos e a regulamentação, o que, segundo os pesquisadores, pode gerar riscos à saúde pública caso o conhecimento não acompanhe a prática.
A revisão analisou estudos epidemiológicos e farmacológicos sobre o uso de psilocibina ao longo de 2024 e encontrou um aumento expressivo no consumo, especialmente entre adultos de 19 a 50 anos. Esse crescimento veio acompanhado de um aumento nas chamadas aos centros de controle de intoxicação e revelou uma variação de até 20 vezes na potência dos cogumelos psicodélicos disponíveis no mercado, além de inconsistências na presença de compostos triptamínicos menores.
Os autores alertam que o uso de cogumelos não regulamentados, com alta variabilidade de composição e consumo combinado com outras substâncias, representa uma preocupação urgente de saúde pública. Eles defendem a necessidade de investir em pesquisa aplicada, educação pública, testes de potência e avaliação de riscos por faixa etária, em vez de restringir o debate a estudos clínicos de laboratório com psilocibina sintética.
A equipe da Universidade do Colorado que liderou a revisão enfatiza que ainda se sabe pouco sobre os efeitos de curto e longo prazo da psilocibina natural consumida fora do ambiente clínico. O status da substância como droga de Classe I nos Estados Unidos, ao lado da cannabis, continua sendo um obstáculo central à pesquisa.
Apesar disso, há avanços recentes. O Scottsdale Research Institute (SRI) recebeu autorização federal para produzir psilocibina natural para estudos científicos, e o primeiro financiamento público para essa linha de pesquisa foi aprovado no Arizona em 2024.
Os pesquisadores ressaltam que o objetivo da revisão não é defender leis mais rígidas, mas promover uma agenda de pesquisa que acompanhe o crescimento do uso social e terapêutico da psilocibina. Assim como a cannabis, afirmam, os cogumelos psicodélicos apresentam riscos e benefícios que variam conforme o contexto, a saúde e a idade de cada indivíduo.
Enquanto a DEA analisa um pedido de reclassificação da psilocibina, o debate político também avança. Um projeto de lei bipartidário apresentado em abril por Jack Bergman (Partido Republicano) e Lou Correa (Partido Democrata) propõe US$ 30 milhões anuais para criar centros de excelência em terapias psicodélicas em instalações do Departamento de Assuntos de Veteranos, com foco em substâncias como psilocibina, MDMA e ibogaína.
Nos bastidores do governo, cresce o interesse em explorar os psicodélicos como alternativas terapêuticas, especialmente no tratamento de transtornos mentais e no apoio a veteranos. Para os pesquisadores, é hora de as políticas públicas e o financiamento científico acompanharem a transformação cultural já em curso.
