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O protagonismo das terapias multidisciplinares no tratamento de doenças com psicodélicos

by Redação

Por Lucas Cury*

Nos últimos anos, a psilocibina, substância presente em alguns cogumelos, deixou de ser apenas tema de contracultura para se tornar objeto de estudos promissores sobre saúde mental, especialmente ligada a protocolos de tratamento voltados para a depressão resistente, transtornos ligados à ansiedade, TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) e dor crônica. A ciência tem mostrado recentemente que o futuro do tratamento não está somente na molécula em si, mas sim na forma como ela é integrada a terapias multidisciplinares.

A psilocibina se conecta a receptores específicos de serotonina como o 5HT2A e promove uma espécie de “reset” neural. Em vez de reforçar os mesmos trajetos já estabelecidos, ela abre novas vias de comunicação no cérebro. Esse movimento reduz a hiperatividade da rede neural padrão, ligada ao funcionamento automático da mente, e aumenta a conectividade global entre diferentes regiões cerebrais, permitindo que o paciente acesse memórias, emoções e sensações que até então estavam inacessíveis.

Dessa forma, a experiência com psilocibina não se torna somente farmacológica, mas sensorial. E é justamente nesse ponto que as terapias multidisciplinares entram. Terapias como musicoterapia, aromaterapia, cromoterapia, grounding – que envolve o contato direto com a natureza, como andar descalço, por exemplo – e práticas de respiração não devem ser vistas como alternativas ou paralelas, mas sim como complementos científicos dentro de um protocolo de tratamento com psilocibina.

Esses estímulos sensoriais ajudam o cérebro a redirecionar informações para áreas ligadas ao prazer e à conexão, fortalecendo a formação de novas memórias afetivas positivas. Com isso, em vez de o paciente ficar preso em lembranças dolorosas ou em hábitos compulsivos, ele aprende a acessar zonas de bem-estar que podem se perpetuar por meses após a sessão. Um estudo conduzido pela Imperial College London mostrou que a qualidade da conexão do paciente com a música durante a sessão prediz a intensidade da experiência e até a melhora clínica dias depois.

Vale destacar que cada paciente responde ao tratamento de forma diferente. Para alguns, os sons despertam lembranças prazerosas. Para outros, os aromas ou o simples contato com a areia ou a grama, por exemplo, cumprem esse papel. Por isso, os protocolos mais avançados defendem um tratamento personalizado, no qual o paciente experimenta diferentes estímulos até descobrir quais funcionam melhor para ele.

A terapia cognitivo-comportamental (TCC) também é parte fundamental desse processo. Ela prepara o paciente antes da sessão, oferecendo segurança e auxílio depois do uso da psilocibina, ajudando a consolidar os aprendizados. Resumindo: a psilocibina abre caminhos, mas é a TCC que fornece segurança e estrutura para que o paciente possa se entregar à experiência.

Ainda que protocolos oficiais como os desenvolvidos na Austrália com MDMA e nos EUA com psilocibina não incluam necessariamente essas práticas, uma coisa é fato: o reconhecimento de que a combinação de estímulos sensoriais com psicodélicos como a psilocibina, representa uma evolução no modelo terapêutico que está crescendo cada vez mais.

Mais do que aliar terapias alternativas à psilocibina, o que se propõe é o contrário: usar a substância como chave de acesso para que terapias multidisciplinares ganhem potência no resgate do bem-estar do paciente. Essa mudança de perspectiva coloca a medicina em um patamar mais humano, no qual ciência e cuidado se encontram para ajudá-lo não somente a ter seus sintomas e doenças tratadas, mas reencontrar conexão e sentido na vida.

*Dr. Lucas Cury é médico pós-graduado em neurologista, especialista no uso da cannabis medicinal como ferramenta terapêutica para diversas condições neurológicas. “Minha abordagem é baseada em ciência, segurança e personalização do tratamento, sempre focada na melhora da qualidade de vida dos meus pacientes. Com anos de experiência, combino tecnologia, pesquisa e atendimento humanizado para oferecer soluções eficazes para doenças como epilepsia, dor neuropática, Parkinson, Alzheimer, esclerose múltipla, autismo e distúrbios do sono”.

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