Estudo internacional publicado pela Frontiers indica que canabinoides inibem crescimento e invasão de células tumorais, inclusive em linhagens resistentes a quimioterapia
Pesquisadores identificaram que dois compostos da Cannabis, o canabidiol (CBD) e o tetrahidrocanabinol (THC), apresentam efeitos promissores contra células de câncer de ovário em testes de laboratório. O estudo foi publicado na revista científica Frontiers in Pharmacology e aponta que a combinação dos dois canabinoides foi capaz de inibir a reprodução e induzir a morte de células tumorais, inclusive em tipos resistentes a tratamentos convencionais.
O câncer de ovário é considerado um dos tumores ginecológicos mais letais. A dificuldade de diagnóstico precoce, as altas taxas de recorrência e a resistência a medicamentos à base de platina tornam o tratamento complexo e frequentemente agressivo para as pacientes. Diante desse cenário, cientistas buscam novas abordagens terapêuticas com maior eficácia e menor toxicidade.
A pesquisa foi conduzida por uma equipe internacional liderada pela Universidade de Khon Kaen, na Tailândia. Os pesquisadores testaram os efeitos do CBD e do THC, isoladamente e em conjunto, em duas linhagens diferentes de células de câncer de ovário: uma sensível à quimioterapia tradicional e outra resistente. Também foram avaliados os impactos das substâncias em células saudáveis.
Os resultados mostraram que tanto o CBD quanto o THC reduziram significativamente a capacidade das células cancerígenas de se multiplicarem. No entanto, o efeito mais expressivo foi observado quando os dois compostos foram utilizados juntos. Segundo os autores, a combinação foi especialmente eficaz na eliminação das células tumorais, enquanto os compostos isolados tiveram efeito mais limitado sobre a morte celular.
De acordo com o estudo, a proporção de 1 para 1 entre CBD e THC apresentou o melhor desempenho. Além disso, os testes indicaram que os canabinoides reduziram a capacidade de migração das células cancerígenas, um fator diretamente relacionado à formação de metástases — principal causa de morte em pacientes com câncer de ovário.
Outro achado relevante foi a baixa toxicidade observada em células saudáveis, o que sugere que terapias derivadas desses compostos poderiam, no futuro, ser melhor toleradas do que os tratamentos atualmente disponíveis.
Para compreender os mecanismos envolvidos, os cientistas analisaram vias de sinalização celular associadas ao crescimento tumoral. Uma delas, conhecida como PI3K/AKT/mTOR, costuma estar hiperativada no câncer de ovário e está relacionada tanto ao avanço da doença quanto à resistência aos tratamentos. Os resultados indicam que o CBD e o THC ajudaram a restaurar o controle dessa via, o que pode explicar a redução da proliferação e a morte das células cancerígenas.
Apesar dos resultados animadores, os autores ressaltam que o estudo é preliminar. Todos os experimentos foram realizados exclusivamente em laboratório, sem testes em animais ou seres humanos. Dados sobre absorção, metabolização e segurança clínica dos compostos ainda não foram avaliados.
“Embora nosso estudo ainda seja inicial, ele estabelece uma base importante para futuras pesquisas sobre as possíveis aplicações do CBD e do THC no tratamento do câncer de ovário”, afirmou o pesquisador Siyao Tong, autor principal do trabalho. Segundo ele, os achados podem impulsionar novos estudos pré-clínicos e, se confirmados em modelos mais complexos, contribuir para o desenvolvimento de terapias inovadoras.
Os pesquisadores também destacam que questões regulatórias e legais envolvendo o uso medicinal de canabinoides podem representar desafios adicionais para a aplicação clínica dessas descobertas.
A reportagem foi originalmente publicada pela Frontiers, plataforma internacional de divulgação científica.