Por Marina Gentil*
O ano mal começou, e já temos a certeza de que a cannabis será um dos temas centrais no Brasil. E não é para menos: 60 mil condenações podem ser revistas, a Anvisa deve atualizar a RDC 327, e o setor segue em uma crescente que, há poucos anos, era inimaginável. Mas se olharmos só para esses avanços, corremos o risco de perder de vista o verdadeiro potencial do que está por vir.
Porque a cannabis não é só indústria, nem só justiça. É saúde, é ciência, é qualidade de vida – e, para muitos, é dignidade. Como advogada, empresária da área e mãe de uma criança que depende do acesso à cannabis medicinal, vejo de perto como cada pequena mudança no setor pode transformar vidas. E, ainda assim, a burocracia insiste em testar a paciência de pacientes e familiares que não podem esperar por comissões, votações e prorrogações de resoluções.
A promessa de novos produtos para 2025, como os de uso tópico, é bem-vinda, mas não resolve o problema central: o acesso. Medicamentos importados seguem sendo artigo de luxo, e os nacionais ainda enfrentam entraves absurdos. Enquanto isso, quem planta para tratar um filho, um avô ou a si mesmo vive com medo da polícia bater à porta. A ciência avança, a opinião pública muda, mas a criminalização segue atrasada no tempo.
E por falar em atraso, não podemos ignorar o impacto social dessa mudança na legislação penal. Rever condenações ligadas à maconha é um passo essencial, mas precisa vir acompanhado de algo maior: um sistema que pare de punir quem já foi injustiçado. Em 2025, precisamos falar sobre reparação, sobre ressocialização, sobre como dar oportunidades a quem teve a vida travada por uma guerra às drogas seletiva e ineficaz.
Se este ano promete surpresas, que sejam boas. Que a cannabis possa deixar de ser tratada como um problema para finalmente ser reconhecida como solução – na justiça, na saúde e na economia. E se dezembro foi marcado por Simone nos perguntando “Então é Natal”, janeiro deveria começar com um novo refrão: “E aí, 2025, vai deixar a cannabis crescer em paz ou vamos ter que esperar mais um ano?”
*Marina Gentil é advogada OAB/SC, pós graduanda em Cannabis Medicinal, diretora jurídica da Green Couple Assessoria e CEO da Clínica Sativa.