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Especialistas da Unicamp propõem mudanças nas regras da Anvisa para ampliar o acesso à cannabis medicinal no Brasil

by Redação

Documento pede reconhecimento da cannabis como produto manipulado, ampliação da prescrição por profissionais da saúde e aumento no limite de THC

Pesquisadores, profissionais da saúde e representantes da sociedade civil se reuniram na Unicamp para elaborar uma proposta de revisão da atual regulamentação da cannabis medicinal no Brasil. O grupo redigiu um documento com quase 30 sugestões de mudança na RDC 327/2019, norma da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que regula o uso terapêutico da planta no país.

A proposta, que será encaminhada à Anvisa como resposta à consulta pública aberta pela agência, visa desburocratizar o acesso aos derivados da cannabis e ampliar o uso terapêutico de compostos como o THC e o CBD, reconhecendo seu potencial terapêutico e rompendo com estigmas ainda presentes na legislação brasileira.

Entre os principais pontos defendidos no documento está a inclusão da cannabis como produto magistral – ou seja, passível de manipulação em farmácias. A medida permitiria maior personalização no tratamento e redução de custos para pacientes que hoje enfrentam altos preços em produtos importados ou industrializados.

O grupo também propõe a ampliação das categorias profissionais autorizadas a prescrever medicamentos à base de cannabis. Atualmente, apenas médicos podem fazer esse tipo de prescrição. A proposta sugere que cirurgiões-dentistas e outros profissionais da saúde capacitados também possam indicar tratamentos com canabinoides, especialmente em casos relacionados à dor e inflamações.

Outro ponto central da proposta é a revisão do limite permitido de tetrahidrocanabinol (THC) nas formulações, hoje restrito a 0,2% para a maioria dos pacientes. O grupo defende que esse teto seja elevado para 0,3%, ampliando o número de pessoas que podem se beneficiar do componente psicoativo da planta, essencial para o alívio de sintomas em diversas condições clínicas.

“Ainda existe um mito de que o CBD é a molécula boa e o THC a ruim, mas isso não é verdade”, afirma Priscila Mazzola, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unicamp e uma das organizadoras do encontro. “O THC tem enorme valor terapêutico, especialmente quando usado em combinação com outros canabinoides.”

A proposta também chama atenção para o fato de que a cannabis contém centenas de canabinoides além do THC e do CBD, como o CBG e o CBN, que ainda não estão regulamentados no Brasil, mas possuem potencial terapêutico promissor. O grupo defende o incentivo à pesquisa e regulamentação desses compostos, assim como o reconhecimento da importância dos terpenos, flavonoides e outros elementos presentes na planta.

Outra sugestão importante é a inclusão de derivados da cannabis em novas categorias de produtos, como suplementos alimentares e cosméticos – algo já comum em mercados mais avançados, como o dos Estados Unidos e do Canadá. A proposta também sugere o estudo de formulações combinadas entre canabinoides e medicamentos sintéticos já aprovados, ampliando o leque de possibilidades terapêuticas.

Justiça social e fortalecimento das associações de pacientes

O documento reconhece ainda o papel fundamental das ações judiciais e das associações de pacientes no avanço da cannabis medicinal no Brasil, inclusive por meio do cultivo associativo – prática que permite a produção de medicamentos por meio de habeas corpus coletivos.

Hoje, os pacientes brasileiros têm quatro caminhos principais para obter produtos à base de cannabis:

  1. Autocultivo, mediante decisão judicial.
  2. Importação direta, com prescrição médica.
  3. Compra em farmácias autorizadas.
  4. Cultivo associativo, com respaldo judicial.

Segundo o Anuário da Cannabis Medicinal no Brasil 2024, da Kaya Mind, o país já conta com mais de 672 mil pacientes em tratamento com cannabis medicinal, demonstrando o avanço do tema mesmo diante de uma regulamentação ainda restritiva.

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