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Importações de cannabis medicinal disparam na Alemanha e desafiam tentativa de endurecimento regulatório

by Redação

País importou quase 57 toneladas no terceiro trimestre de 2025 e já dobrou o volume total de 2024, mesmo diante de propostas para restringir prescrições e telemedicina

A Alemanha segue ampliando de forma acelerada o acesso à cannabis medicinal, apesar das pressões políticas para conter o crescimento do mercado. Dados oficiais do Instituto Federal de Medicamentos e Dispositivos Médicos (BfArM) mostram que o país importou 56,9 toneladas de cannabis medicinal entre julho e setembro de 2025, um novo recorde histórico e um avanço de 19,3% em relação ao trimestre anterior.

Com isso, o volume acumulado nos nove primeiros meses do ano chegou a 142 toneladas, quase o dobro de tudo o que foi importado ao longo de 2024. Mantido esse ritmo, a Alemanha deve ultrapassar 200 toneladas até o fim do ano, superando novamente o teto anual de importações, que já precisou ser ampliado pelo regulador em 70 toneladas após o limite anterior ter sido excedido ainda em setembro.

O dado chama atenção por ocorrer justamente às vésperas da sessão plenária do Bundesrat, marcada para 21 de novembro, quando serão debatidas propostas que podem restringir o acesso à cannabis medicinal no país. Para analistas do setor, o crescimento não indica descontrole, mas sim uma demanda consistente de pacientes — e, paradoxalmente, pode estar sendo impulsionado pelo temor de retrocessos regulatórios.

O aumento trimestral, embora ligeiramente menor que o observado no segundo trimestre, quando o avanço foi de 26%, segue expressivo. Mesmo com desaceleração marginal, a tendência aponta para um mercado robusto e em plena expansão, sustentado por prescrições médicas e pela ampliação do acesso após a retirada da cannabis da Lei de Entorpecentes alemã.

Canadá e Portugal continuam dominando o fornecimento, respondendo juntos por cerca de 80% das importações. O Canadá reforçou sua posição como principal exportador global de cannabis medicinal, com crescimento de 49%, alcançando 30,1 toneladas no terceiro trimestre. Portugal, por sua vez, consolidou-se como principal hub europeu, com alta de 23% e volume de 16,6 toneladas.

Outros países também ganharam protagonismo. Macedônia do Norte registrou aumento de 56%, Espanha mais que dobrou suas exportações, e Malta teve seu maior trimestre da história, com crescimento de três vezes e meia. Na África, África do Sul e Lesoto ampliaram embarques, enquanto a Colômbia voltou a aparecer como fornecedora relevante após forte retração no trimestre anterior.

Em sentido oposto, mercados tradicionais como Holanda, República Tcheca e Argentina apresentaram queda, indicando uma reorganização da cadeia global em torno de países com maior capacidade regulatória e produtiva.

Para especialistas, o avanço das importações não é um sinal de falha regulatória, mas de um sistema que passou a reconhecer a cannabis como medicamento e respondeu a uma demanda reprimida de pacientes. Ainda assim, o Comitê de Saúde do Bundesrat recomendou mudanças que podem restringir prescrições, publicidade, distribuição e, sobretudo, a telemedicina — modalidade que ampliou significativamente o acesso ao tratamento, especialmente em regiões com escassez de médicos prescritores.

Entre as propostas está a exclusão do reconhecimento de prescrições emitidas por médicos de outros países da União Europeia, além da criminalização administrativa do envio de flores de cannabis por correio. Críticos alertam que tais medidas podem penalizar pacientes, elevar custos e reduzir a oferta, sem apresentar evidências claras de benefício sanitário.

Analistas do setor apontam que experiências recentes, como a da Polônia, mostram que anúncios de restrição tendem a gerar corrida por prescrições e estoques, inflando temporariamente os números antes de um provável impacto negativo no acesso. Na avaliação de especialistas, o crescimento atual reflete não apenas estratégias comerciais, mas o receio de que o momento mais liberal do mercado alemão esteja chegando ao fim.

Para os pacientes, o cenário atual tem significado maior diversidade de produtos e preços mais baixos. A dúvida, segundo o próprio setor, é se esse avanço baseado em acesso regulado e prescrição médica será preservado ou substituído por um novo ciclo de barreiras, que pode empurrar parte da demanda de volta para a informalidade — um efeito já conhecido das políticas proibicionistas.

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