Pesquisa com integrantes de programas olímpicos e paralímpicos do Canadá indica melhora no sono, relaxamento e redução da dor, mas revela receio de punições por regras antidoping
Atletas de alto rendimento têm recorrido ao canabidiol (CBD) como estratégia para aliviar dores musculares, melhorar o sono e acelerar a recuperação física após treinos intensos. É o que indica um estudo publicado neste mês na revista científica Frontiers in Nutrition, com dados coletados entre o fim de 2021 e meados de 2023 no Canadá.
A pesquisa ouviu 80 atletas canadenses de elite, vinculados a 27 organizações nacionais de esporte. Para participar do estudo, era necessário integrar ou ter integrado programas olímpicos ou paralímpicos do país. Do total de entrevistados, 38% relataram já ter usado CBD ao longo da carreira, e quase um terço desses afirmou manter o uso no momento da pesquisa.
Entre os atletas que utilizaram o composto, a percepção de benefício foi ampla. Segundo os dados, 96% consideram o CBD seguro, 93% afirmaram melhora na qualidade do sono, 90% relataram maior sensação de relaxamento e 77% disseram que a substância ajudou a reduzir dores relacionadas ao treinamento.
Os resultados refletem uma tendência crescente de uso do CBD com fins terapêuticos, inclusive fora do ambiente esportivo. De acordo com os autores, os atletas associam o canabidiol tanto à recuperação física quanto ao bem-estar mental após competições e ciclos intensos de preparação.
Apesar disso, o uso de CBD ainda gera insegurança entre atletas profissionais. Embora a Agência Mundial Antidoping (WADA, na sigla em inglês) tenha retirado o canabidiol da lista de substâncias proibidas em 2018, todos os demais canabinoides, incluindo o THC, seguem vetados em competições oficiais.
Esse cenário cria um risco permanente de doping involuntário. Muitos produtos comercializados como CBD podem conter traços de THC ou outros canabinoides proibidos, o que levou diversos atletas a evitarem ou abandonarem o uso da substância. Segundo o estudo, esse foi o principal motivo relatado por quem optou por não experimentar o CBD ou interromper seu consumo.
Os pesquisadores, ligados à Universidade McGill e ao Canadian Sport Institute, destacam ainda que alguns alimentos e bebidas enriquecidos com CBD podem, em determinadas condições químicas, converter o composto em THC. Em ambientes de baixo pH, essa conversão poderia gerar níveis suficientes da substância para resultar em um teste antidoping positivo. O esforço físico intenso antes da coleta de exames também pode aumentar a detecção de THC no organismo.
Outro dado relevante é a origem das informações acessadas pelos atletas. Muitos afirmaram ter conhecido o CBD por meio de amigos ou da internet, e não por orientação direta de médicos do esporte ou equipes técnicas. Para os autores, isso evidencia a falta de protocolos claros e de educação baseada em evidências no ambiente esportivo de alto rendimento.
O estudo surge em um contexto de mudanças graduais nas políticas esportivas em relação à cannabis. Nos Estados Unidos, ligas como a Major League Baseball retiraram a maconha da lista de substâncias proibidas em 2019, enquanto a NBA fez o mesmo em 2023. A NCAA e a NFL também têm revisado suas diretrizes à medida que a legalização avança em diferentes estados.
Uma pesquisa financiada pela NFL em 2024 indicou maior aceitação do uso de cannabis entre atletas, acompanhada da necessidade de ampliar informações sobre benefícios e riscos tanto para competidores quanto para profissionais de saúde e formuladores de políticas esportivas.
Para os autores do estudo canadense, os dados reforçam a urgência de diretrizes mais claras, fiscalização de qualidade dos produtos e formação técnica adequada, para que atletas não fiquem presos entre o potencial terapêutico do CBD e o medo de comprometer a própria carreira.
