Uma agência federal de saúde dos Estados Unidos deve autorizar, em breve, a inclusão de produtos à base de CBD na cobertura de determinados planos vinculados ao Medicare, o sistema público que atende idosos no país. A medida representa uma inflexão importante na política nacional sobre cannabis e ocorre em meio a pressões crescentes por alternativas terapêuticas mais seguras e acessíveis.
A sinalização de mudança acontece cerca de um mês após o Secretário de Saúde e Serviços Humanos (HHS), Robert F. Kennedy Jr., reunir-se com Howard Kessler, líder de uma organização que produziu um vídeo divulgado pelo presidente Donald Trump, no qual o CBD é exaltado como ferramenta terapêutica e defendido como um tratamento que deveria ser coberto pelo Medicare.
Os Centros de Serviços de Medicare e Medicaid (CMS), órgão ligado ao HHS, publicarão no Diário Oficial Federal um aviso sobre alterações em áreas como cobertura de medicamentos, processos de inscrição e regras de programas especiais. Entre as revisões está a mudança mais significativa: a inclusão do canabidiol entre os produtos que podem ser reembolsados pelo sistema.
Hoje, as normas do Medicare proíbem a cobertura de qualquer produto derivado de cannabis, incluindo CBD de cânhamo, mesmo após sua legalização federal em 2018. Uma regra aprovada em abril reforçava essa proibição a partir de 2026. A nova proposta, entretanto, altera esse cenário ao restringir a exclusão apenas aos produtos considerados ilegais sob leis estaduais ou federais.
Com isso, derivados de cânhamo legalizados em nível federal, incluindo o CBD, passam a ser potencialmente elegíveis para cobertura em 2027, desde que também cumpram as normas da Lei Federal de Alimentos, Medicamentos e Cosméticos.
Embora a mudança abra caminho para que idosos em estados onde o CBD é legal acessem o tratamento via plano de saúde, o ambiente regulatório americano para o cânhamo vive uma fase de tensão. Alterações recentes na legislação federal, que entram em vigor no próximo ano, e novas restrições estaduais ao comércio de canabinoides podem limitar severamente o mercado, sobretudo pela exigência de concentrações quase nulas de THC. Para muitos fabricantes, isso inviabiliza boa parte dos produtos, o que pode afetar diretamente o que será elegível à cobertura.
No documento que será publicado esta semana, o CMS destaca que cânhamo e derivados permanecerão fora da lista federal de substâncias controladas até 11 de novembro de 2026, e continuarão assim a partir da nova definição prevista para entrar em vigor em 12 de novembro do mesmo ano. A agência também confirma que produtos como sementes de cânhamo descascadas, proteína de cânhamo e óleo de semente poderiam ser cobertos por planos do Medicare Advantage, já que a FDA os classifica como seguros para consumo.
Segundo um resumo obtido pela Bloomberg, versões iniciais da proposta indicavam que a cobertura poderia começar por pacientes idosos em tratamentos oncológicos e cuidados paliativos, áreas onde o uso terapêutico do CBD tem sido amplamente discutido.
A mudança ganha ainda mais destaque pelo contexto político. Kennedy, que já se manifestou publicamente a favor do uso terapêutico de cannabis e psicodélicos, discutiu o tema diretamente com Kessler, cujo projeto foi responsável por um vídeo que Trump divulgou em setembro. No material, o CBD é descrito como uma das iniciativas de saúde mais importantes para a população idosa neste século.
O vídeo também cita brevemente dados da Fox News que estimam uma economia anual de até US$ 64 bilhões caso a cannabis medicinal fosse plenamente integrada ao sistema de saúde americano.
O Commonwealth Project, organização de Kessler, também atua no processo federal que analisa a possível reclassificação da cannabis, iniciado ainda no governo Biden. Em parecer enviado às autoridades, o grupo defendeu que a mudança seria “histórica” e permitiria maior segurança para que pesquisadores, médicos e idosos participem de estudos e projetos pilotos sobre cannabis medicinal.
A proposta do CMS ainda passará por período de consulta pública antes de ser formalizada, mas já marca um avanço significativo na quebra de barreiras proibicionistas que, há décadas, impedem o acesso de milhões de pacientes a terapias baseadas em cannabis — mesmo em um país que lidera globalmente a produção científica sobre o tema.
