A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 660, de 2022, da Anvisa, tem se mostrado crucial para o acesso a produtos derivados de cannabis, oferecendo uma alternativa importante para muitos pacientes brasileiros. A norma permite que pacientes importem diretamente medicamentos canabinoides, um recurso vital para aqueles que lutam contra condições como câncer, dor crônica e fibromialgia.
Atualmente, cerca de 219 mil pacientes utilizam a RDC 660, que representa mais de 70% dos tratamentos canabinoides no país. Em contraste, a RDC nº 327, que regulamenta apenas 37 produtos, frequentemente resulta em preços mais altos e opções limitadas. Rodolfo Rosato, CVO da Terracannabis, observa que “só na Terracannabis facilitamos o acesso a mais de 300 produtos, todos com controle de qualidade de lotes. A RDC 660 realmente facilita o acesso a produtos de qualidade, ao contrário da 327, que não apresentou testes de qualidade.”
Entretanto, a RDC 660 enfrenta resistência. O Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) solicitou a revogação da norma, alegando que ela não atende a padrões de segurança e qualidade. Em resposta, Rosato criticou a posição do sindicato, afirmando que “parece que não se importam com o bem-estar dos pacientes ou estão totalmente alienados da realidade.”
A psiquiatra Ana Hounie, também preocupada com a revogação, declarou: “Acabar com a 660 é um retrocesso e pode prejudicar o tratamento de milhares de pessoas. Enquanto não houver produção nacional, não se pode acabar com a 660.”
Luís Maurício, presidente da ABCCI, acrescentou: “Estamos sendo procurados por muitas empresas que trabalham na 660. Precisamos unir forças para garantir que os pacientes tenham acesso a esses medicamentos vitais. É um caminho que não pode ser interrompido, especialmente quando o SUS já enfrenta tantas dificuldades. Nossa luta é pela democratização e pelo acesso sem sobrecarregar ainda mais nosso sistema de saúde.”
A criação da RDC 660 foi uma resposta à demanda crescente por produtos canabinoides. Leonardo Padilha, advogado especializado, ressaltou que “a RDC 660 não é uma benesse da Anvisa, mas uma conquista dos pacientes. Eles foram às vias judiciais para garantir seu direito de importar medicamentos.” Essa mobilização resultou em decisões favoráveis que permitiram a importação direta, algo que antes não era viável.
A posição do Sindusfarma, que se baseia na falta de autorização sanitária para produtos importados, foi criticada por Padilha: “O que a Sindusfarma está fazendo é buscar garantir sua fatia de mercado em detrimento da saúde do paciente. Isso é uma afronta ao direito humano de se tratar e escolher seu próprio remédio.”
Além disso, associações médicas, como a Pan-Americana de Medicina Canabinoide e a Associação Médica Brasileira de Endocanabinologia, também enviaram ofícios à Anvisa, defendendo a manutenção da RDC 660. Segundo um representante da Pan-Americana, “a RDC 660 é uma proteção ao direito dos pacientes de escolherem seus tratamentos. Qualquer tentativa de revogação comprometerá não apenas o acesso, mas também a qualidade dos cuidados.”
Os números são claros: em 2022, a Anvisa concedeu 80.413 autorizações para importação de produtos canabinoides, com esse número subindo para 136.754 em 2023. O setor empresarial também mostra sinais de crescimento, com 600 empresas participantes nesse mercado.
A batalha em torno da RDC 660 é emblemática de um conflito maior entre interesses econômicos e a saúde pública. Rodolfo Rosato expressou a frustração de muitos: “Causa profunda tristeza que interesses econômicos e lobby tentem favorecer o oligopólio das indústrias farmacêuticas em detrimento de tantas vidas e sofrimento. Precisamos unir todos contra esse lobby.”
Luís Maurício destacou a importância do diálogo entre as partes envolvidas: “Precisamos ouvir os pacientes e entender suas necessidades. Nossa responsabilidade é garantir que todos tenham acesso ao tratamento que realmente funciona para eles. Não podemos deixar que interesses econômicos coloquem em risco a saúde de milhares de pessoas.”
À medida que o debate avança, a proteção do acesso a medicamentos canabinoides se torna uma questão crucial. Pacientes, médicos e defensores da saúde pública estão mobilizados para garantir que a RDC 660 permaneça em vigor, assegurando que aqueles que necessitam de tratamentos eficazes possam continuar a tê-los à disposição. A luta por direitos e acesso à saúde está apenas começando, refletindo a urgência de se garantir que políticas de saúde pública atendam verdadeiramente às necessidades da população.